terça-feira, 5 de agosto de 2014

Expurgo








Somos o asqueroso fato que macula a realidade. Somos o asco, a nojenta sensação de sujeira, de demência, de náusea. Somos como o beco urinado, como o sanitário abarrotado. Somos o pênis sujo, os lençóis encharcados de suor azedo. Somos o câncer, a chaga, a ferida... Mornos, como o vômito regurgitado com força. Amargos, como o gosto que deixa na boca. Nas nossas, nenhum beijo, nenhum carinho. Só o acre sabor das palavras de fel! Somos um vazio profundo e letárgico. Um tamborilar de sons irritantes. Somos as pedras nos caminhos e sapatos. A incômoda sensação de desconforto. A dor no peito de um cardíaco, a vontade inata de cagar quando não se pode... Apertamos nossas carnes num espaço inabitável. Esprememo-nos numa realidade que não nos cabe. Mutilamo-nos, desconstruímo-nos, e nos afastamos, ao mesmo passo que nossas partes parecem fundir-se. E somos esse cheiro de carne queimada. Uma carne viva, ensanguentada e pulsante. Somos o último suspiro do moribundo. O oco da cova putrefata. Um caiado sepulcro escuro. A inverdade que impera e o caos. As pessoas que mais se amaram no mundo, e ainda assim, as que, com toda a certeza, menos se amaram.

05/08/2014

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